Os golpes digitais estão se tornando cada vez mais comuns e sofisticados no Brasil e, segundo a Serasa Experian, apenas no primeiro trimestre de 2025 foram registradas quase 1,9 milhão de tentativas de fraude contra bancos e cartões, estabelecendo um aumento de 21,5% em relação ao mesmo período de 2024, com prejuízos que podem ultrapassar a alçada de R$ 15,7 bilhões.

Segundo a Agência Brasil, cerca de 51% dos brasileiros relataram ter sido vítimas de algum tipo de fraude no mesmo ano e, entre eles, 54,2% efetivamente perderam dinheiro. Os prejuízos financeiros são expressivos: apenas em 2024, o total estimado chegou a R$ 10,1 bilhões, com destaque para os golpes via Pix, que cresceram 43% e causaram perdas de R$ 2,7 bilhões. O prejuízo médio por vítima foi de R$ 6.311,00 (seis mil e trezentos e onze reais), valor equivalente a quase quatro salários mínimos segundo relatório da TransUnion.

Diante desse cenário alarmante, este texto busca oferecer mais do que um panorama dos principais golpes e dicas de prevenção, vamos também abordar os aspectos jurídicos envolvidos: quais os direitos do consumidor, quando o banco pode ser responsabilizado e, especialmente, quais medidas legais podem ser adotadas por quem foi vítima de fraude digital. O objetivo é informar e empoderar o cidadão, tanto na prevenção quanto na defesa de seus direitos.

 

DIREITOS DO CONSUMIDOR: QUANDO O BANCO DEVE SER RESPONSABILIZADO?

 

A relação entre bancos e clientes vai muito além de depósitos e saques, pois ao abrir uma conta, realizar uma transferência, solicitar um cartão ou contratar um empréstimo, você está consumindo um serviço financeiro. Por isso, a legislação brasileira trata essa relação como uma relação de consumo.

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), os bancos são enquadrados como fornecedores de serviços, e seus clientes, como consumidores. Sendo assim, os bancos estão sujeitos às normas que protegem o consumidor contra práticas abusivas, falhas de segurança e omissões.

Nesse tipo de relação, aplica-se a chamada responsabilidade objetiva, que nada mais é do que a possibilidade de responsabilização do banco por danos sofridos pelos clientes, mesmo que não tenha tido a intenção ou culpa direta pelo problema, basta que haja falha no serviço prestado ou prejuízo decorrente de risco da atividade bancária.

Os bancos lucram oferecendo serviços financeiros, mas isso também traz obrigações como a de garantir segurança nas operações, conferir proteção dos seus dados pessoais e bancários, acesso à sua conta, a integridade de transações como Pix, TED e DOC, bem como as comunicações via aplicativo, e-mail e telefone.

Golpes cada vez mais comuns como phishing (links falsos para roubo de dados), engenharia social (manipulação psicológica para obter informações), clonagem de WhatsApp, falsos atendentes, entre outros, estão diretamente ligados à atividade bancária. Isso porque os criminosos se aproveitam de brechas em sistemas e falhas de verificação de identidade.

De acordo com o entendimento jurisprudencial, esses golpes fazem parte do chamado fortuito interno, ou seja, são riscos previsíveis e inerentes à operação dos bancos. Como essas situações fazem parte do risco da atividade, o banco deve responder pelos prejuízos causados aos consumidores.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou o entendimento de que os bancos devem arcar com os danos causados por golpes relacionados à sua atividade. A Súmula 479 do STJ estabelece: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”

A partir disso, podemos concluir que os casos como pix feito por golpistas se passando por familiares ou amigos, o desbloqueio de cartão feito por terceiros com dados do cliente, bem como empréstimos consignados contratados sem autorização e transferências realizadas por fraude no aplicativo do banco, se enquadram nas hipóteses em que a responsabilidade recai sobre o banco.

Portanto, o consumidor não precisa provar que o banco teve culpa, basta demonstrar que houve uma falha no serviço e que isso causou um prejuízo. No entanto, há limites estabelecidos em lei para proteção ao consumidor, que prevê a isenção de responsabilidade do banco da obrigação de indenizar quando este comprova que o problema ocorreu por culpa exclusiva do consumidor.

Isso acontece, por exemplo, quando o cliente fornece sua senha pessoal a terceiros, ignora alertas de segurança ou orientações do próprio banco, clica voluntariamente em links falsos, apesar de alertas visíveis e frequentes ou usa o aplicativo bancário em dispositivos não seguros, já comprometidos por vírus ou malwares.

Nesses casos, se o banco conseguir provar que tomou todas as medidas de segurança adequadas e que o consumidor agiu com descuido extremo, pode não haver responsabilidade.

 

O QUE FAZER SE VOCÊ FOI VÍTIMA DE UM GOLPE?

 

A atuação rápida e bem documentada é fundamental para quem foi alvo de fraude digital, além de buscar apoio do banco, o consumidor tem respaldo jurídico para exigir ressarcimento e reparação. 

Veja quais atitudes são juridicamente recomendadas nesse tipo de situação:

  • Comunique imediatamente o banco, formalizando a reclamação por canais oficiais e solicitando o bloqueio da operação ou da conta, pois isso demonstra diligência e permite que o banco atue para mitigar os danos;
  • Registre um boletim de ocorrência, seja presencialmente ou pela internet. Esse documento é essencial em eventual processo judicial;
  • Guarde todas as provas disponíveis, como prints de mensagens, comprovantes de transferência, e-mails e protocolos de atendimento;
  • Busque orientação jurídica especializada. Em caso de recusa do banco em restituir os valores, o consumidor pode ingressar com uma ação judicial com base no CDC e na jurisprudência consolidada.

Os pedidos judiciais mais comuns envolvem a devolução do valor perdido e, em muitos casos, indenização por danos morais, especialmente quando há falha na prestação do serviço, demora na resposta do banco ou abalo emocional significativo.

Além disso, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) também pode ser acionada se houver falha na proteção dos dados pessoais do consumidor, uma vez que a instituição financeira tem obrigação legal de adotar medidas eficazes para evitar vazamentos e acessos indevidos e, a violação desse dever, pode reforçar ainda mais a responsabilização do banco.

 

COMO SE PROTEGER: DICAS PRÁTICAS COM FUNDAMENTO LEGAL

 

Embora a legislação proteja o consumidor, é importante lembrar que os tribunais também levam em conta a conduta da vítima na hora de analisar cada caso, por isso adotar boas práticas digitais não só ajuda a evitar prejuízos como também reforça a responsabilidade do banco em caso de golpe. Vejamos algumas medidas de prevenção que podem ser adotadas:

  1. Não compartilhe senhas, códigos SMS ou e-mails com ninguém, mesmo que se identifique como funcionário do banco. O compartilhamento voluntário desses dados pode ser interpretado como culpa concorrente ou exclusiva, o que pode comprometer a responsabilização da instituição;
  2. Ative a autenticação em duas etapas nos aplicativos bancários e no WhatsApp, reduzindo o risco de invasões;
  3. Desconfie de mensagens urgentes pedindo dinheiro, mesmo de pessoas conhecidas, prática comum em fraudes de engenharia social;
  4. Confirme com a pessoa por outro canal antes de fazer transferências, especialmente via WhatsApp;
  5. Evite clicar em links de origem duvidosa ou baixados por SMS, redes sociais e e-mail;
  6. Use redes Wi-Fi seguras e evite transações financeiras em conexões públicas;
  7. Verifique o nome do recebedor antes de confirmar um Pix, pois esse pequeno cuidado pode evitar muitos golpes.

Essas ações, embora simples, fortalecem a posição do consumidor diante do banco em caso de litígio, demonstrando boa-fé, diligência e cautela, aspectos que podem ser decisivos em uma disputa judicial.

Os golpes digitais são uma realidade perigosa e crescente no Brasil, mas o consumidor não está desamparado. A legislação brasileira oferece proteção sólida, e os tribunais têm reconhecido que os bancos têm dever de segurança e devem responder por fraudes, exceto quando provada a culpa exclusiva do cliente.

Assim, adotar práticas seguras é fundamental para prevenir fraudes e também para garantir respaldo jurídico caso um golpe ocorra e, em situações de prejuízo, agir com rapidez, reunir provas e buscar suporte jurídico faz toda a diferença, pois o conhecimento da lei é uma ferramenta poderosa na defesa dos seus direitos.

Em caso de recusa do banco em ressarcir os prejuízos decorrentes de fraude, recomenda-se que o consumidor consulte uma advocacia especializada em Direito do Consumidor, a fim de avaliar a viabilidade de ação judicial com base no Código de Defesa do Consumidor e na jurisprudência consolidada.

 

REFERENCIAS:

 

AGÊNCIA BRASIL. Metade dos brasileiros sofreu fraude em 2024, diz Serasa Experian. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2025-03/metade-dos-brasileiros-sofreu-fraude-em-2024-diz-serasa-experian?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 28 jul. 2025.

BRAZIL ECONOMY. Fraudes digitais disparam no país e custam mais de R$ 6 mil aos brasileiros. Disponível em: https://brazileconomy.com.br/2025/06/fraudes-digitais-disparam-no-pais-e-custam-mais-de-r-6-mil-aos-brasileiros/?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 28 jul. 2025.

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em: 28 jul. 2025.

PODER360. Golpes digitais crescem 45% em 2024, diz associação. Disponível em: https://www.poder360.com.br/poder-brasil/golpes-digitais-crescem-45-em-2024-diz-associacao/?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 28 jul. 2025.

SERASA EXPERIAN. Setor bancário sofreu quase 2 milhões de tentativas de fraude no 1º trimestre de 2025, aponta Serasa Experian. Disponível em: https://www.serasaexperian.com.br/sala-de-imprensa/prevencao-a-fraude/setor-bancario-sofreu-quase-2-milhoes-de-tentativas-de-fraude-no-1-trimestre-de-2025-aponta-serasa-experian/?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 28 jul. 2025.

SERASA EXPERIAN. Tentativas de fraudes bancárias cresceram 104% em 2024 e poderiam gerar prejuízo de até R$ 5,16 bilhões, revela Serasa Experian. Disponível em: https://www.serasaexperian.com.br/sala-de-imprensa/prevencao-a-fraude/tentativas-de-fraudes-bancarias-cresceram-104-em-2024-e-poderiam-gerar-prejuizo-de-ate-r-516-bilhoes-revela-serasa-experian/?utm_source=chatgpt.com. Acesso em: 28 jul. 2025.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). Súmula 479. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/sumstj/toc.jsp?livre=%27479%27.num.&O=JT. Acesso em: 28 jul. 2025.

 

Escrito por CARLOS EDUARDO ALMEIDA